domingo, 14 de dezembro de 2008

Augusto e seus anjos



Um dos primeiros temas que gostaria de falar, é a poesia. Não a tradicionalmente conhecida com suas diversas classificações, mas sim a inclassificável. A poesia de Augusto dos Anjos é por assim dizer incomparável, inconfundível.
Esse paraibano, nascido em 1884, compôs o seu primeiro poema aos 7 anos, e este certamente não foi tão crítico como os ele costumou escrever durante toda a sua vida, que foi tomada pela arte, arte pura. A complexidade de suas poesias não as torna incompreensíveis, pelo contrário, é esta complexidade que caracteriza sua obra. É complexa porque é cheia de vida.
Os temas nefastos e mórbidos não representam o desgosto pela vida, e sim a sua revolta de viver da forma que se vive.
Uma das poesias que mais gosto do Augusto dos Anjos, é sem dúvidas, Vencedor:




Vencedor

Toma as espadas rútilas, guerreiro,
E á rutilância das espadas, toma
A adaga de aço, o gládio de aço, e doma
Meu coração — estranho carniceiro!

Não podes?! Chama então presto o primeiro
E o mais possante gladiador de Roma.
E qual mais pronto, e qual mais presto assoma,
Nenhum pode domar o prisioneiro.

Meu coração triunfava nas arenas.
Veio depois de um domador de hienas
E outro mais, e, por fim, veio um atleta,

Vieram todos, por fim; ao todo, uns cem...
E não pude domá-lo, enfim, ninguém,
Que ninguém doma um coração de poeta!


Mas certamente um dos mais conhecidos seja Versos Íntimos, desculpem os que sabem, mas muitos nem sabem que este é de Augusto dos Anjos.


Versos íntimos

Vês?! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão - esta pantera
-Foi tua companheira inseparável!

Acostuma-te a lama que te espera!
O Homem que, nesta terra miserável,
Mora entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera

Toma um fósforo, acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro.
A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se a alguém causa ainda pena a tua chaga
Apedreja essa mão vil que te afaga.
Escarra nessa boca de que beija!



Bom, fica aqui a chama acesa para a pesquisa sobre Augusto dos Anjos, gostaria de encerrar com um poema que escrevi em homenagem a este incomensurável poeta.


A morte do poeta

Hoje o mundo chora,
Morre aquele poeta.
Homem esse que outrora,
Tivera sua vida mais completa.

Interrompida naquele momento,
Trazendo a outros, grande sofrimento.
Momento de ápice, o tal
Que atingira seu ideal.

E todo e qualquer vestígio
É imortalizado por seu prestígio.
Que recolhera em toda sua andança.
Onde fizera toda aquela lambança,
Mascarada pelo devaneio,
Que atingira qualquer meio.

Sua boa poesia
Atinge com demasia,
A toda a massa do mundo.
Atinge até o recôndito mais profundo.
A mente dos idiotas,
Às escleroses das velhotas.
Senhoras e senhores,
Às crianças ocasiona horrores.

É o mundo perfeito
Na ponta da caneta.
É o filho imperfeito
Nascido de proveta.

É o cigarro acendido
Aos prantos.
É o beijo dos arcanjos,
Abrindo encantos.
É o mundo sofrido
De Augusto dos Anjos.

Marcos Fernandes

4 comentários:

  1. Comovente.... antes de tudo, muito justo. Quem sabe a mais bela homenagem que o poeta pode ter recebido, mesmo depois de tanto tempo de sua morte. Até parece Augosto dos Anjos, homenageando Augusto dos Anjos, dada a perfeita inspiração...

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  2. De certo ele deve se comover, ao menos assim espero! Certo dia, um amigo me apresentou um livro, que recolhe textos de um espírita que, segundo ele, transcrevia poesias de alguns autores já mortos (de carne), entre eles estava Augusto dos Anjos. A forma que se escrevia, as palavras empregadas eram tão fidedignas às que o próprio escrevia, que até um sético como eu ficaria surpreso... Vou pesquisar sobre este livro novamente, e indico à todos...

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  3. Acho que tudo, ou quase tudo, que não conhecemos ou não sabemos explicar acaba sendo tratado com desdem, com preconceito por determinadas pessoas... Já ouvi, nos tempos de colégio que as poesias de Augusto dos Anjos não prestavam, por justamente ele ter tal complexidade e usar tantas palavras de força ao escrever.
    É uma pena muita gente pensar isso dele, pois, eu, apesar de não entender muitas de suas poesias, o admiro e não tenho preconceitos.
    Adorei sua iniciativa em exaltar pessoa tão genial quanto Augusto dos Anjos!

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  4. E o interessante Silmara, é que muitas pessoas ainda são imbuidas de preconceito com a arte... Existe preconceito de quem não faz arte, de quem gosta de arte, e até de quem faz arte!!!
    Muitas vezes (e ainda hoje) eu lia os poemas de Augusto dos Anjos com um dicionário na mão, livro indispensável para a leitura... E quando as palavras são reveladas, mostra-se que aquela poesia não merecia outra palavra a não ser a que foi empregada de fato...

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